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Como implementar personalização em escala com IA?
20 de out. de 2025
Descubra como a IA está redefinindo o Revenue Growth Management com personalização em escala, decisões autônomas e eficiência em trade marketing.
Todo mundo quer se sentir único. Mas quando falamos de personalização em escala no contexto de indústrias de bens de consumo (FMCG) e farmacêuticas, não estamos falando apenas de experiência do consumidor. Estamos falando de uma transformação estrutural na forma como empresas gerenciam receita, alocam investimentos promocionais e constroem vantagem competitiva sustentável.
As indústrias de Farma e FMCG investem anualmente entre 15% e 25% de sua receita bruta em atividades de trade marketing e promoção. Contudo, um paradoxo persiste: uma parcela significativa desse investimento não gera o retorno esperado, perdida em promoções genéricas, baixa aderência no ponto de venda e uma compreensão superficial sobre o comportamento real do shopper. A personalização em escala com IA surge como a solução para transformar esse cenário, convertendo gastos dispersos em estratégia de precisão dentro de um framework de Revenue Growth Management (RGM).
O que é personalização em escala?
Personalização em escala é a capacidade de individualizar decisões em massa, com base em dados transacionais, contextuais e comportamentais. No RGM, ela opera como sistema de orquestração que orienta onde investir, quanto investir e quando realocar, de acordo com elasticidade e valor de ciclo de vida.
Jeff Bezos já articulava essa visão ao explicar a estratégia da Amazon no MIT:
"A noção de centralidade no cliente é construir um lugar onde cada cliente individual tenha seu próprio website. E fazer isso, em grande parte, não por informações explícitas que o cliente fornece, mas através da observação implícita de seu comportamento no site. De modo que personalizamos essa experiência com base nas ações que eles tomam."
O que Bezos descreveu há mais de duas décadas como diferencial competitivo da Amazon tornou-se, hoje, uma necessidade operacional para empresas que competem em mercados de alta complexidade como Farma e FMCG. Quando aplicada ao RGM, a personalização em escala deixa de ser uma tática de marketing para se tornar uma arquitetura operacional de crescimento.
Pesquisas da McKinsey indicam que empresas que dominam a personalização conseguem gerar aumentos de 10% a 15% na receita (com variações de 5% a 25% dependendo do setor e da capacidade de execução), além de melhorar o ROI dos gastos com marketing em até 30% [1]. Mais importante: a personalização reduz o custo de aquisição de clientes em até 50% e aumenta a eficiência do trade spend ao direcionar investimentos para os shoppers com maior propensão de conversão.
Personalização do passado x personalização do futuro
A personalização percorreu três grandes fases ao longo das últimas duas décadas, refletindo a maturidade das empresas em dados, tecnologia e governança de rentabilidade. No contexto de Revenue Growth Management (RGM), essa trajetória representa a transição de um modelo centrado em campanhas e volume para um modelo centrado em decisões integradas e geração de margem.
1ª Fase: o início da personalização
Entre os anos 2000 e 2015, a personalização era essencialmente tática e reativa. O foco estava em adaptar promoções e comunicações para grupos específicos de clientes, normalmente com base em dados demográficos ou históricos de compra. Em RGM, isso se traduzia em ajustes pontuais de preço e incentivo, iniciativas desarticuladas, com baixo nível de integração entre marketing, vendas e trade. As decisões eram tomadas com base em médias e planilhas, e o preço ainda era visto como uma variável operacional, não estratégica. Essa etapa marcou o início da personalização, mas sem impacto estrutural sobre rentabilidade.
2ª Fase: personalização em escala
A segunda fase, de 2016 a 2022, trouxe a era da personalização em escala. Com o avanço da automação e o acesso a grandes volumes de dados, as empresas começaram a integrar informações de vendas, estoques e comportamento de compra, segmentando mercados em clusters e micromercados. No entanto, embora a personalização tenha ganhado volume, ainda era determinística, baseada em regras fixas, sem capacidade de prever comportamentos futuros. O desafio passou a ser menos sobre tecnologia e mais sobre velocidade: as organizações conseguiam processar dados, mas não reorquestrar preço, portfólio e promoção com a agilidade que o mercado exigia. O ganho estava na escala, mas a inteligência ainda era limitada.
3ª Fase: hiperpersonalização
A terceira fase, iniciada em 2023, marca o início da personalização com Inteligência Artificial, um novo paradigma que combina aprendizado contínuo, integração de dados e tomada de decisão autônoma. A IA permite cruzar dados comportamentais, transacionais e contextuais (como clima, localização e padrão de consumo) para prever elasticidade de preço, propensão de compra e retorno de promoção em tempo real. No RGM, isso significa que as decisões deixam de ser parametrizadas e passam a ser autoajustáveis. Modelos de IA preditiva e generativa já são capazes de sugerir (ou executar) alterações automáticas em sortimento, incentivos e posicionamento de preço, reduzindo dispersão de verba e maximizando ROI.
Personalização vs. Hiperpersonalização
Antes de falarmos sobre o futuro da personalização, é importante diferenciar dois conceitos que frequentemente se confundem. A personalização tradicional adapta experiências e decisões com base em perfis ou segmentos de consumidores, um conjunto de regras derivado de médias históricas.
Já a hiperpersonalização, impulsionada por Inteligência Artificial, leva esse conceito ao extremo: combina dados comportamentais, contextuais e situacionais em tempo real para tomar decisões individualizadas e dinâmicas. No contexto de RGM, isso significa sair de um modelo que “responde” ao comportamento do shopper para um modelo que o antecipa, ajustando preço, portfólio e investimento promocional com precisão preditiva. A diferença não é apenas de escala, mas de velocidade, aprendizado e valor capturado.
Processos e Governança
Essa nova fase desloca o desafio das ferramentas para as pessoas e processos. A questão central deixa de ser “como implementar IA” e passa a ser “como governar IA”. Empresas que já possuem dados integrados, governança executiva e times maduros em RGM estão migrando para um estágio de RGM preditivo, no qual o papel da liderança é supervisionar, validar e refinar as decisões automatizadas, não mais executá-las manualmente.
Em síntese, a personalização passou por três estágios claros:
Antes, a personalização era sobre relevância.
Hoje, é sobre eficiência e escala.
Amanhã, será sobre governança inteligente e velocidade de realocação, decidir certo antes da concorrência.
A diferença fundamental está na transição da segmentação tradicional para a personalização preditiva: deixamos de olhar para o passado demográfico para antecipar o futuro comportamental, otimizando desde o investimento promocional até a arquitetura de portfólio em tempo real.
Como implementar um modelo de personalização em escala?
O case da Coca-Cola Company
A trajetória da Coca-Cola Company ilustra como a personalização com IA deixa de ser um experimento de marketing e se torna um sistema de decisão corporativa — ancorado em governança, ROI e escalabilidade.
O caso mostra que o sucesso da IA em FMCG não depende apenas de tecnologia, mas da capacidade de coordenar pessoas, processos e prioridades em torno de resultados financeiros tangíveis.
Efeito Top-down
Em 2023, a Coca-Cola criou um Digital Council, liderado pelo CFO John Murphy e composto por executivos de tecnologia, marketing e operações, com o objetivo de revisar todas as iniciativas digitais em andamento. O diagnóstico inicial revelou duplicidades, esforços isolados e ausência de métricas padronizadas de impacto, uma realidade comum em grandes corporações antes de alcançar maturidade digital.
A resposta foi um modelo simples, porém decisivo: todo projeto de IA deveria estar vinculado a um resultado mensurável, seja geração de receita ou ganho comprovado de eficiência operacional. Essa diretriz, reforçada pelo CEO James Quincey, consolidou o papel da IA não como ferramenta experimental, mas como vetor de crescimento econômico. A governança executiva garantiu que as prioridades de investimento fossem coerentes com o plano de RGM global da companhia.
IA preditiva aplicada à execução comercial
Sob a liderança de Neeraj Tolmare, Chief Information Officer da Coca-Cola, a empresa desenvolveu um algoritmo de previsão de demanda voltado para os pontos de venda. O sistema triangula dados históricos de vendas, variáveis climáticas e informações de geolocalização para antecipar o consumo por região e categoria. A IA passou a alertar, via WhatsApp, gerentes de lojas sobre o momento ideal para reabastecer refrigeradores, prevenindo rupturas e perdas de venda.
O piloto foi testado em três países e apresentou aumento de 7% a 8% nas vendas em relação às lojas controle. Mais importante que o ganho percentual foi o avanço na eficiência do ciclo de decisão: a informação flui do modelo para o operador de campo sem necessidade de múltiplas camadas de aprovação, acelerando a execução e criando um ciclo contínuo de aprendizado.
IA generativa e escala de conteúdo
A mesma lógica de eficiência se estendeu à área de marketing. Com mais de 200 marcas vendidas em 200 países, a Coca-Cola enfrentava o desafio de adaptar ativos de comunicação a 130 idiomas e diferentes contextos culturais, um processo tradicionalmente caro e lento. Com IA generativa, a companhia criou 20 peças principais e gerou 10.000 variações locais, respeitando nuances culturais e linguísticas. O tempo de produção caiu para um terço do anterior, e o engajamento médio aumentou em 20%.
Segundo Tolmare, “a IA provou que pode desbloquear valor que um ser humano não conseguiria pela escala e velocidade da computação necessária”.
Governança, não glamour
Os resultados da Coca-Cola não vieram de apostas isoladas, mas de disciplina organizacional. Cada projeto é avaliado com base em retorno marginal e potencial de replicação global. O conselho digital atua como fórum de priorização, evitando a dispersão de iniciativas e assegurando que o aprendizado de um piloto alimente as próximas decisões, um verdadeiro ciclo de RGM digital.
A empresa também mantém diretrizes éticas rigorosas para o uso de IA generativa, prevenindo vieses e “alucinações” em conteúdo criativo. Tolmare ressalta que o desafio não é apenas tecnológico, mas humano:
“Temos que aprender a trabalhar junto com a IA, deixá-la fazer o que é impossível para nós, mas dentro de uma estrutura responsável.”
Lições de maturidade para RGM
O caso da Coca-Cola oferece três aprendizados fundamentais para empresas que buscam integrar personalização e IA ao RGM:
A IA só escala quando há governança. O sucesso depende de uma estrutura executiva que vincule cada projeto a métricas financeiras e garanta alinhamento interfuncional.
ROI, não curiosidade. Pilotos precisam nascer com hipótese de impacto e mecanismos de mensuração claros, seja em receita incremental ou eficiência operacional.
Integração é a nova vantagem competitiva. A combinação entre dados de sell-in, sell-out, clima, mídia e execução no PDV é o que transforma IA em ativo estratégico.
A Coca-Cola mostra que o futuro do RGM não está apenas em coletar dados, mas em transformá-los em decisões orquestradas e mensuráveis, onde tecnologia e governança caminham juntas. Essa é a diferença entre experimentar IA e crescer com IA.
No futuro, o sucesso competitivo em Farma e FMCG não será definido por quem alcança mais consumidores, mas por quem os compreende mais profundamente e age sobre essa compreensão com precisão cirúrgica. Mais do que comunicar melhor, trata-se de entender profundamente para agir com precisão.
Sua empresa está preparada para transformar a personalização com IA como arquitetura de crescimento?




